Esclerose em placas e microbiota: o consumo de carne tem impacto?
Doença neurodegenerativa autoimune, a esclerose em placas (EM) afeta 2,5 milhões de pessoas em todo o mundo. Um recente estudo publicado no eBioMedicine, destaca uma rede de associações entre o consumo de carne, o aumento de certos metabolitos no sangue, marcadores pró-inflamatórios e uma diminuição das bactérias digestoras de polissacarídeos nos pacientes com esta doença. Explicações.
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Sobre este artigo
Se as últimas pesquisas recentemente revelaram uma implicação da microbiota intestinal (MI) na patogénese da EM, estes mecanismos ainda permanecem desconhecidos.
Uma abordagem multiómica inédita
Pela primeira vez, uma equipa de investigação interessou-se pelas interligações entre o regime alimentar, o sistema imunitário, o metabolismo e a microbiota intestinal no desenvolvimento e na progressão da EM. Para isso, foi utilizada uma metodologia multiómica.
Esta abordagem inédita foi objeto de um estudo de 6 meses. O sangue e as fezes de 49 participantes (24 pacientes com EM e não tratados e 25 indivíduos não doentes) foram colhidos no início do estudo e 6 meses mais tarde. Os perfis metabólicos como a MI de todos os pacientes mantiveram-se estáveis durante mais de 6 meses. Foi também solicitado que cada paciente registasse o que comiam em cada refeição.
Relações alteradas entre a microbiota intestinal e o sistema imunitário nos pacientes com EM
Estudos anteriores mostraram constatações similares, ou seja que a estrutura das comunidades bacterianas é globalmente similar entre os dois grupos. Entretanto, os pacientes com EM apresentavam uma abundância mais fraca de bactérias com propriedades imunomoduladoras. Para além disso, o grau de invalidez dos pacientes e as suas microbiotas eram diferentes sugerindo que algumas espécies poderiam estar associadas à gravidade da doença.
Os resultados das análises multiómicas sugerem também disfunções na homeostasia das relações microbioma - sistema imunitário. De facto, uma dissociação das interações entre as células imunitárias e o microbioma como também uma modificação do perfil metabólico sanguíneo foram observadas no grupo de pacientes afetados pela EM.
Consumo de carne: é uma explicação possível?
O estudo do diário alimentar dos participantes desempenhou um papel chave no processo.
Na realidade, verificou-se que o consumo de carne era superior nos pacientes afetados pela EM. Este consumo estava correlacionado com um aumento da quantidade de células Th17, implicadas no processo da autoimunidade e da S-adenosil-L-metionina (SAM), um metabolito produzido a partir da metionina (aminoácido enriquecido na carne) e implicado na ativação das células Th17. Em contrapartida, os pacientes com EM tinham uma proporção reduzida de B. thetaiotaomicron, uma bactéria conhecida pela sua grande capacidade de digerir polissacarídeos.
Uma potencial nova terapêutica?
Estes dados destacam as vias de interação entre a alimentação, a microbiota intestinal, a resposta imunitária e o metaboloma sanguíneo através da B. thetaiotaomicron, Th17 e SAM. Para os autores, estes resultados podem sugerir que uma restrição alimentar em carne ou metionina poderia fazer diminuir o número de células inflamatórias circulantes Th17 nos pacientes com EM
Compreender melhor as vias de regulação entre a alimentação, os metabolitos, a resposta imunitária e a microbiota pode permitir o agravamento da esclerose em placas. Aqui estão todas as questões deste estudo com resultados promissores que poderiam o caminho a novos alvos terapêuticos. Este estudo, que tem sido divulgado na imprensa médica, é de particular interesse clínico e será discutido no Dia Mundial da EM, no próximo dia 30 de maio.