Cancro da mama, antibióticos e microbiota intestinal: uma combinação perdedora
O recurso a antibióticos é habitual em pacientes com cancro da mama, por exemplo para prevenir infeções oportunistas ou durante períodos de imunodeficiência. Neste estudo, os investigadores demonstram, num modelo de rato com cancro da mama, que os antibióticos, ao induzirem desequilíbrios na microbiota intestinal, podem acelerar o crescimento do tumor.
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Sobre este artigo
A microbiota intestinal (MI) tem participação na evolução de certas doenças e de vários cancros. No entanto, existem poucos estudos visando determinar a sua influência no cancro da mama. Por sua vez, os antibióticos têm impacto na população bacteriana da MI. Contudo, a utilização de antibióticos é habitual em pacientes com cancro, apesar de haver controvérsia quanto aos seus benefícios. O que faltava ainda demonstrar? Não existiam investigações que permitissem avaliar os efeitos dos antibióticos na MI e o respetivo impacto na evolução do cancro da mama. Essa lacuna foi agora preenchida através de um estudo em modelo de rato, recentemente publicado em iSciences.
Crescimento acelerado do tumor e depauperamento da microbiota nos ratos tratados com antibióticos
Antes e depois da injeção de células tumorais específicas do cancro da mama, os ratos foram submetidos a um cocktail de antibióticos: vancomicina, neomicina, metronidazol, anfotericina e ampicilina (VNMAA). Relativamente ao grupo de controlo, estes animais exibiram rapidamente um crescimento tumoral significativamente acelerado e um depauperamento considerável da microbiota intestinal.
Os investigadores concentraram-se depois nas consequências de um antibiótico amplamente utilizado em pacientes com cancro da mama: a cefalexina. Ora, embora a cefalexina tenha um impacto mais limitado sobre a microbiota do que o cocktail VNMAA, o aumento no crescimento do tumor foi similar ao induzido por este.
Papel antitumoral de determinadas bactérias intestinais
Nos ratos sob terapia por antibióticos, a metagenómica tornou possível demonstrar a existência de disbiose, não favorável às bactérias patogénicas, mas em detrimento de bactérias protetoras. De facto, os animais tratados com VNMAA e cefalexina apresentaram uma redução da abundância relativa de bactérias que se pensa desempenharem uma função antitumoral: Lactobacillus reuteri, Lachnospiraceae bacterium e Faecalibculum rodentium. A simples reintrodução desta última bactéria tornou possível restaurar o nível de crescimento tumoral anterior.
Os mastócitos, motores do crescimento tumoral em caso de disbiose
As perturbações na microbiota induzidas pelos antibióticos não têm impacto significativo sobre o microambiente imunitário do tumor. Em contrapartida, induzem um aumento do número de mastócitos no estroma tumoral.
Os investigadores trataram os ratos sob terapia antibiótica e os de controlo com cromoglicato, um estabilizador de mastócitos. Embora o cromoglicato mostrasse inibir o crescimento do tumor nos animais tratados com antibióticos, não exerceu qualquer influência sobre os do grupo de controlo. Estes dados sugerem um potencial papel dos mastócitos na evolução do cancro da mama em indivíduos com disbiose induzida por antibióticos.
Ainda que este estudo se concentre num modelo de rato, ele abre novas perspetivas para o tratamento do cancro da mama. É agora essencial compreender de onde vem o referido aumento dos mastócitos, que mudanças ocorrem nestes em resposta à perturbação da microbiota e o que é responsável por induzir essas mudanças e como as promove.