Antibióticos, uma faca de dois gumes no tratamento de doenças da pele
Os efeitos dos antibióticos na microbiota da pele têm sido estudados principalmente no contexto do tratamento do acne. Os antibióticos podem levar a vários resultados adversos, incluíndo interrupção da microbiota, resistência bacteriana e um risco aumentado de novas infeções, ao verificar-se que afetam a pele ou outras partes do corpo.
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Pele
Por muito tempo considerada principalmente como uma fonte de infeção, a microbiota da pele humana é hoje comumente aceite como um fator importante de saúde e bem-estar1. Ao promover respostas imunológicas e defesa, desempenha um papel fundamental na reparação dos tecidos e funções de barreira, inibindo a colonização ou infeção por patogénicos oportunistas2.
Para cada área de peke, uma microbiota próprio
A microbiota da pele abriga milhões de bactérias, bem como fungos e vírus em menos quantidades. Corynebacterium, Cutibacterium (anteriormente conhecido como Propionibacterium), Staphylococcus, Micrococcus, Actinomyces, Streptococcus e Prevotella são os géneros mais comuns de bactérias encontrados na pele humana3. No entanto, a abundância relativa de taxa bacteriana depende muito do microambiente local da área específica da pele e, principalmente, das suas características fisiológicas, isto é, se é sebácea, húmida ou seca. Portanto, as espécies de Cutibacterium lipofílicas dominam nas áreas sebáceas, enquanto as espécies de Staphylococcus e Corynebacterium são particularmente abundantes em áreas húmidas4.
Da fisiologia à patologia, o papel ambivalente de C. acnes
O anaeróbio aerotolerante C. acnes é uma das espécies bacterianas mais abundantes no microbioma da pele. Tem sido implicada no acne, como uma doença inflamatória crónica da pele com patogénese complexa5. Em contraste com a observação anterior, estudos recentes indicam que a hiperproliferação de C. acnes não é o único fator implicado no desenvolvimento do acne6. Na verdade, uma perda de equilíbrio entre as diferentes estirpes de C. acnes, juntamente com uma disbiose da microbiota da pele, desencadeia a acne6. Além disso, as interações entre S. epidermidis e C. acnes são de importância crítica na regulação da homeostase da pele: S. epidermidis inibe o crescimento de C. acnes e a inflamação da pele. Por sua vez, C. acnes, ao segregar ácido propiónico que participa, entre outras coisas, na manutenção do pH ácido do folículo pilossebáceo, inibe o desenvolvimento de S. epidermidis. Acredita-se que a Malassezia, o fungo cutâneo mais abundante, também desempenhe um papel no acne refratário ao recrutar células do sistema imunológico, embora este dado precise ser mais explorado6.
Antibióticos na dermatite atópica: amigo ou inimigo?
Na dermatite atópica (DA), os doentes apresentam disbiose da microbiota cutânea caracterizada por um crescimento excessivo de Staphylococcus aureus, que se pensa que desempenham um papel decisivo na manifestação da DA14. Embora os tratamentos com antibióticos não tenham demonstrado nenhuma eficácia no tratamento da DA15 podem induzir resistência bacteriana e resultar em impacto deletério nos comensais da pele14,16, quando usados regularmente.
Tratamento do acne, uma importante fonte de resistência aos antibióticos
Apesar de serem usados rotineiramente no tratamento do acne os antibióticos tópicos e orais têm-se demonstrado prejudiciais. Uma das grandes preocupações expressa pelos especialistas é o desiquilíbrio da microbiota da pele, embora ainda existam poucos dados precisos sobre o assunto. Nesse sentido, um estudo longitudinal recente comparou a microbiota da face de 20 doentes com acne, antes e depois de seis semanas de terapia com doxiciclina oral. Curiosamente, a exposição a antibióticos foi associada a um aumento na diversidade bacteriana; Segundo os autores, isso pode ser devido a uma diminuição da colonização por C. acnes, que permite o crescimento de outras bactérias7.
No entanto, a preocupação mais significativa com o uso de antibióticos para o tratamento do acne diz respeito à resistência bacteriana.. Observada pela primeira vez na década de 1970, é sem dúvida uma preocupação na dermatologia desde os anos 19808. A resistência a C. acnes é de longe a mais documentada: os dados mais recentes apontam para taxas de resistência que atingem mais de 50% para eritromicina em alguns países, 82-100% para azitromicina e 90% para clindamicina. Quanto às tetraciclinas, embora ainda sejam bastante eficazes contra a maioria das estirpes de C. acnes, as taxas de resistência estão a aumentar variando de 2% a 30% consoante a região geográfica do planeta9. A resistência aos antibióticos não se limita a C. acnes; embora os antibióticos tópicos usados por doentes com acne (especialmente como monoterapia) tenham demonstrado aumentar o surgimento de bactérias resistentes da pele, como S. epidermidis, os antibióticos orais estão associados ao aumento da emergência de S. pyogenes orofaríngeo resistente a antibióticos8,10. Além disso, taxas do aumento de infeções do trato respiratório superior e de faringite estão descritos e associadas ao aumento do uso dos antibiótico do acne11,12.
Recomendação de uso limitado de antibióticos contra o acne
Facto é que, os níveis de prescrição de antibióticos para o acne permanecem elevados e por períodos mais longos do que os recomendados nas diretivas13. Neste contexto de crescentes preocupações os especialistas apelam para um uso mais limitado de antibióticos no tratamento do acne13. Em particular, foi proposta uma estratégia a este respeito pela aliança global para melhorar os resultados contra o acne (ver figura abaixo).
Painel: Estratégias da Aliança Global para melhorar os resultados no Acne e reduzir a resistência aos antibióticos na Cutibacterium acnes e outras bactérias.
Primeira linha terapêutica
- Combinar retinoide tópico com antimicrobiano (tópico ou oral).
No caso de ser necessário adicionar outro antibiótico:
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Limitar o uso por período de tempo; descontinuação quando as melhoras são leves ou sem melhoras.
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Antibióticos orais podem ser usados apenas por 3 meses.
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Coprescrição de produtos que contêm peróxido benzoíla.
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Não usar em monoterapia. • Evite o uso de um outro antibiótico oral ou tópico.
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Não mude de antibiótico sem uma justificação clínica.
Terapêutica de manutenção
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Usar retinoides associados com peróxido benzoíla se necessário
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Evitar os antibióticos
From de Walsh et al., 20165
Caso clínico
pela Pr. Brigitte Dréno, MD, PhD
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Um adolescente consultou o seu dermatologista para tratar acne facial (testa, queixo e seios perinasais), recebeu um tratamento tópico à base de eritromicina.
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4 a 5 semanas após o início do tratamento, uma nova proliferação de pápulas e pústulas surgiram no rosto. Voltou ao médico e foi-lhe prescrito eritromicina oral.
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1 mês depois, o doente voltou ao médico porque o acne tinha progredido para o pescoço (impetigo profuso). O médico retirou para análise uma amostra de uma das pústulas para um teste de cultura.
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O teste de cultura deu positivo ao Staphylococcus e o antibiograma indicou resistência aos macrolídeos. O médico prescreveu peróxido de benzoíla, com remissão em 10 dias.
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