Microbiota oral, fator de risco de cancro do pulmão?

Um primeiro estudo prospetivo, realizado com pacientes que nunca fumaram, poderá revelar uma relação entre a diversidade da microbiota oral e o risco de se vir a sofrer de cancro do pulmão. Uma nova perspetiva que necessita ainda de confirmação.

Publicado em 13 Abril 2021
Atualizado em 19 Agosto 2024

Sobre este artigo

Publicado em 13 Abril 2021
Atualizado em 19 Agosto 2024

O cancro do pulmão é a principal causa de morte por cancro em todo o mundo. Embora o consumo ativo de tabaco surja como o maior fator de risco, 25% dos casos da doença ocorrem entre não fumadores. Trata-se de uma percentagem elevada, que não pode ser totalmente explicada pelos principais riscos identificados: tabagismo passivo, poluição, antecedentes familiares, etc. Para além da microbiota intestinal e do seu papel no aparecimento de alguns cancros gastrointestinais, outros ecossistemas microbianos foram já também associados a riscos oncológicos. Neste estudo, os autores visaram a microbiota oral, cuja composição e cuja capacidade de colonizar o trato respiratório poderão contribuir para o aparecimento do carcinoma brônquico.

Com uma microbiota depauperada, o risco intensifica-se

O referido estudo prospetivo baseou-se numa monitorização a longo prazo de mais de 136.000 habitantes de Xangai que nunca fumaram (61.500 homens e 75.000 mulheres), com consultas de controlo a cada 2 a 3 anos. Foi analisada uma amostra de saliva, recolhida na linha de base, de todos os participantes que posteriormente contraíram cancro do pulmão, e também de um grupo de controlo com igual número de elementos possuidores das mesmas características dos primeiros quanto a sexo, idade, data e hora de recolha das amostras, tratamentos prévios com antibióticos, etc. Em termos finais, a comparação, realizada mediante sequenciação metagenómica, incidiu sobre 114 pacientes e número idêntico de controlos. O que nela ficou demonstrado foi que quanto menor é a diversidade bacteriana existente na microbiota oral, maior é o risco de aparecimento de cancro do pulmão.

Quando a abundância (de Firmicutes) é moléstia...

A composição intrínseca do microbioma oral também parece desempenhar um papel importante. No âmbito desta população de não fumadores, o aumento da abundância relativa de Spirochaetes (espiroquetas) e / ou de Bacteroidetes poderá corresponder a um menor risco. Pelo contrário, um número mais abundante de bactérias pertencentes ao filo das Firmicutes, e em especial da ordem das Lactobacillales, estará associado a um aumento da probabilidade de desenvolvimento de cancro do pulmão. E coube ainda aos autores especificar que estes resultados coincidem com estudos anteriores ao demonstrarem a existência de relação entre as Firmicutes e algumas doenças respiratórias (doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), carcinoma de células escamosas da cabeça e pescoço, cancro do pulmão, etc.).

Microbiota ORL (otorrinolaringológica): investigações complementares para esclarecer o seu âmbito

Esta caraterização em grande escala da microbiota oral proporciona novas perspetivas sobre a etiologia do cancro do pulmão nos não fumadores. A homogeneidade geográfica do estudo reforça a relevância das suas conclusões, mas limita simultaneamente o seu alcance. Trabalhos complementares, a realizar com outras populações e em outras localizações, deverão permitir esclarecer o papel da microbiota ORL no desenvolvimento do carcinoma brônquico e de outras patologias respiratórias.