Autismo: descoberta de uma nova relação com a microbiota intestinal
Um novo estudo apoia a teoria da existência de ligação entre a disbiose intestinal e os transtornos do espectro autista (TEA), cuja prevalência mundial está em crescimento, mas a etiologia permanece desconhecida.
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Sobre este artigo
A hipótese de a disbiose intestinal estar associada ao aparecimento do autismo é suportada por vários elementos. Em primeiro lugar, surge a existência de um desequilíbrio intestinal – caraterizado por carência de Bifidobacterium longum e excesso de Clostridium spp. e Candida albicans – que poderá estar associado à inflamação intestinal e a um aumento da permeabilidade da barreira hematointestinal. Além disso, existem comorbidades gastrointestinais e déficits em enzimas digestivas que são mais frequentes nas crianças com TEA. No entanto, os mecanismos envolvidos e a contribuição da microbiota intestinal na patogénese da doença permanecem mal compreendidos.
Uma nova estratégia de emparelhamento
Contudo, poderá ter sido dado um passo decisivo. Num trabalho publicado em Science Advances, uma equipa comparou o microbioma intestinal de 39 crianças com TEA ao de 40 crianças neurotípicas (com a mesma idade e o mesmo sexo). Esta primeira análise revela variações entre estes dois grupos que atingem 18 espécies bacterianas, embora não permita explicar a participação da microbiota intestinal na patogénese da doença. Para ultrapassarem a diversidade interindividual do microbioma, os investigadores desenvolveram uma estratégia que consiste em emparelhar cada paciente de TEA com um controlo, a partir do perfil metabólico do seu microbioma. Foi assim formada uma nova coorte de 65 binómios, tendo sido realizada uma nova análise metagenómica destinada a identificar as vias metabólicas que diferiam entre os dois grupos.
Um transtorno da destoxificação intestinal
De entre as 96 vias metabólicas associadas aos TEA, havia 5 vias envolvidas na destoxificação intestinal significativamente deficitárias em comparação com os controlos, bem como 8 enzimas que participam na degradação de tóxicos presentes na composição de inseticidas ou de aditivos alimentares. Os autores sugerem que essas anomalias da destoxificação presentes nas crianças com TEA poderão contribuir para uma disfunção mitocondrial capaz de atingir todos os tecidos, incluindo o tecido cerebral. A partir desses dados, os investigadores construíram um modelo de diagnóstico que permite diferenciar as crianças com TEA dos respetivos controlos com uma precisão de 88%.
Permeabilidade intestinal aumentada
Esta descoberta poderá explicar por que razão as crianças com TEA serão tão vulneráveis às toxinas ambientais e sugere que a deficiência no processo de destoxificação intestinal dos pacientes pode estar ligada à patogénese da doença. No entanto, a origem da doença ainda não está esclarecida. De acordo com uma das hipóteses, ela poderá resultar da disbiose intestinal, a qual, ao provocar um aumento da permeabilidade intestinal, permitirá a passagem das toxinas ambientais para o sangue. Estas iriam alterar, entre outras, as mitocôndrias a nível cerebral. Se esta hipótese se vier a confirmar, poderá abrir caminho à conceção de estratégias terapêuticas destinadas a restaurar as capacidades de destoxificação microbiana nos pacientes com TEA, concluem os autores.